sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Ode à palavra

Ser não mais carpideira,
mas carpinteira da tua matéria
tátil e pedregosa e sutil e violenta.
Regente a orquestrar sons e imagens,
pintor a harmonizar tintas
e estampar arco-íris e lápis-lazúli
no teu corpo (ainda) descarnado.

Escultor a martelar e torcer e entortar de novo
tuas dobras e retas e oblíquas,
e tuas superfícies rugosas,
e a dar à tua carne a forma primordial e futura
que quisestes desde sempre.

Guerreiro a travar batalhas em teu nome
no espaço-habitação de três mil outras mônadas,
grileiro a estiolar teus outros nomes dos livros-pai
e tuas infindas tropelias das obras-mãe.

Deixar que repouses como iceberg sob as águas
e só mostrares os pingos dos is,
enquanto o profundo só se dá
ao que é capaz do divinatório.
Comer-te, beber-te, sonhar-te,
pois só você me restou.
Mas que esplendoroso resto és tu!
E nada mais me faltará.





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